segunda-feira, 12 de julho de 2010

Cinco breves comentários sobre a Copa

por Felipe Carrilho

1- Vuvuzela é legal. Parece-me que as críticas da classe média brasileira ao instrumento não passam do velho preconceito elitista e eurocêntrico que a caracteriza. Vamos sugerir apresentações de orquestras sinfônicas nos monumentais estádios que serão construídos no Brasil para a Copa de 2014.

2- O mesmo preconceito está na maneira como a imprensa tratou as reclamações dos jogadores sobre a famigerada bola oficial que, de fato, é muito ruim. "Quem esse bando de analfabetos pensa que é para reclamar de uma bola feita por uma empresa de material esportivo tão competente?" era a indignação mal-velada pelos cronistas. E quem irá negar que as curvas traçadas pela gorducha eram mero produto do acaso, das variações da resistência do ar ou algo do gênero, e não dependiam da destreza ou habilidade do jogador que desferia o chute? Nessa Copa, o efeito foi na verdade um defeito. O lado bom é que alguns jogos enfadonhos saíram do 0 a 0.

3- Vejo com desconfiança o crescimento de uma espécie de "argentinismo" entre os torcedores brasileiros, que ficou bastante evidente nesse mundial. Diversas matérias foram exibidas pelas mídias do país em que conterrâneos declaravam o seu amor pela seleção dos hermanos. Admiro o futebol argentino e o jogo que caracteriza a seleção que o representa, mas não acho que nossos vizinhos sejam mais apaixonados pelo futebol do que os brasileiros. São mais dramáticos, certamente. Além disso, a composição racial da seleção brasileira, se não resolve o problema do racismo em nosso país, ao menos é o que mais se aproxima da realização, na cultura popular, do que gostaríamos de ter no plano social, uma nação em que a diferença representa o seu principal trunfo. Por isso prefiro o futebol brasileiro.

4- A Copa de 2010 foi um palco privilegiado da superstição, e Maradona, Mick Jagger e o polvo Paul foram os seus principais protagonistas, cada um ao seu modo. Algo paradoxal em um mundo tão pragmático e afeito à frieza matemática dos negócios. Até o técnico alemão Joachim Löw, da Alemanha filosófica e do materialismo histórico de Karl Marx, rendeu-se ao poder metafísico de sua camisa azul. O futebol, apesar dessa modernidade toda, parecer nos colocar em contato com o sagrado primitivo, de um tempo em que jogo e religião confundiam-se.

5- A final da Copa foi melancólica para os brasileiros, mesmo com as emoções provocadas por um gol de título feito no segundo tempo da prorrogação. A Holanda tem um time competente, com alguns bons jogadores. A Espanha é e foi superior na partida e mereceu a vitória. Mas acho que ambas as seleções, juntas, não estão à altura de uma final de Copa do Mundo. E talvez esse último comentário seja resultado de uma simples dor-de-cotovelo.

5 comentários:

  1. Acho vuvuzela chato pra cacete, mas se é da cultura dos caras, foi correto permitir o uso. Também acho muito chato o grito "Sou brasileiro, com muito orgulho...", mas se é parte da cultura dos idiotas, deixem cantar. Só que eu fico com vergonha.
    Perfeito o 5º parágrafo, também senti essa dor de cotovelo. Já que sou brasileiro, com muito...Enfim
    Abraços
    PS: sobre o argentinismo, convoco uma sessão etílica urgente para debater o assunto

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  2. Assim como o Renato, acho também as vuvuzelas muito chatas. Para mim, seguem sendo as velhas e nem tão boas cornetas. Tenho dúvidas também do quanto é uma tradição local, mas virou mania e se disseminou.
    O pior é que as vuvuzelas abafavam qualquer outra manifestação, gritos e cantos das arquibancada. O torcer na Copa reduziu-se a assoprar uma corneta.
    Apesar disso, acho que seria um grande absurdo proibir as cornetas/vuvuzelas dos estádios. e não deixa de ser um elemento que se popularizou entre todas as torcidas, e aproximou sulafricanos de torcedores estrangeiros.
    Sobre o que vc chama de argentinismo, acho que ganhou muito mais força aqui o "uruguainismo"... rs
    Mas voltando a sua consideração, não acho que a discussão tenha ficado centrada no fato de que o argentino gostaria muito mais de futebol do que o brasileiro. Acho que são relações diferentes, culturas diferentes.
    O argentino foi saudar a sua seleção, pois viu um time em campo que mesmo sendo goleado, tentou colocar em prática uma forma de jogar com a qual o torcedor se identifica.
    Acho que o brasileiro teve uma reação muito mais fria porque não conseguiu construir um vínculo, não se sentiu identificado com essa seleção. Por mais propaganda que tenha sido feita, o conceito de seleção guerreira em campo, no fim, não emplacou.
    Acho muito legal o destaque que você fez aos "ritos pagãos" e a necessidade de recorrer a explicações sobrenaturais. Em meio a cobranças pelo uso de novas tecnologias, as superstições ainda conseguem assumir uma posição de protagonismo no jogo.
    Pra encerrar, também senti uma ponta de melancolia com o final da Copa. A Espanha foi uma justa campeã em um torneio que pouco empolgou pelo lado técnico. Prova disso foi que a Holanda, um time que não conseguiu jogar bem em momento algum.
    Acho que o Brasil tinha time capaz de ganhar das duas seleções finalistas ou de qualquer outra seleção da Copa, mas nunca vi essa equipe na condição de favorita. E nem jogou bola pra justificar isso. Tanto que acabou perdendo de forma bizarra para os laranjas.
    Acho que pelo caminho também ficaram outras equipes que mostraram mais qualidades como a Alemanha (a seleção que apresentou melhor nível técnico) e Argentina. E nem falo do Uruguai, porque não quero correr o risco de ser chamado de uruguaio... rs

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  3. Não vi tanto "argentinismo" assim. Vi muitos comerciais "engraçadinhos" escrachando os argentinos, chamando de "maricón" e sujos para baixo, e vi o Maradona ser ridicularizado o tempo todo na cobertura da nossa mídia. Se a identificação com a Argentina foi maior por causa disso, tem meu apoio.

    Quanto à Copa, tenho uma visão mais otimista: a melhor coisa que poderia ter acontecido para o Brasil era perder. Se ganhasse, o Dunga iria se tornar ainda mais insuportável e achar que o seu autoritarismo e moralismo barato estão corretos; Jorginho, Kaká e outros iriam dedicar o título às igrejas evangélicas mais picaretas; se defenderia que a seleção de "guerreiros", e não esportistas, foi bem-sucedida; e, principalmente, continuaríamos ouvindo aquelas besteiras: "a seleção de 82 jogou bonito mas não ganhou nada"; "quem é o Cruyff para falar do Brasil, já que não ganhou?"; "prefiro jogar horrível e ganhar a jogar bonito e perder" etc... Pelo menos, não jogou bonito e também perdeu, como aspecto educativo isso foi muito bom, como também o fato da Espanha, que não é nenhum timaço mas joga para a frente e não dá pancada, ter ganho de times que jogaram só no pragmatismo de vencer no contra-ataque, como a Holanda e a Alemanha contra a Espanha.

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  4. Amigos,

    O único comentário que passou ileso foi o da Jabulani. Temos um consenso?

    Abraço.

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  5. Então, acho que houve um exagero acerca do papel exercido pela Jabulani na Copa. Tem alguns frangos, por exemplo, que são frangos e ponto. Como do goleiro inglês, Green. Aquela bola, idenpendente se é uma bola de meia ou uma Jabulani, ela tem que ser pega. Fizeram da Jabulani um escudo. O Felipe Melo falou que no gol contra dele a Jabulani fez uma curva estranha e que não ouviu o Júlio César gritando por conta das vuvuzelas. Ou seja, matou dois coelhos com uma cajadada só. Faça me o favor.

    Mas, à luz da ciência, parece que é uma bola estranha mesmo. Enfim, meu comentário não tem muito nexo. Mas é honesto.
    Abraço

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